Criminalidade: mudando o rumo de estudos e discussões.


O pior efeito da promoção do empirismo-juspositivismo na academia ao longo da história foi, de longe, a destruição das noções de ação humana, incluso de como estuda-las. Grande parte dos estudos sociológicos, psicológicos, geopolíticos, legislativos, etc. baseiam-se em entender ou até direcionar a ação. O surpreendente é saber que a metodologia atual, sistematicamente não possui e não produz conhecimento efetivo algum sobre isso.

Ao restaurar a credibilidade do conhecimento apriorístico e do estudo teleológico, temos duas conclusões importantes: 1) dados empíricos devem ser imediatamente descartados das funções em que são empregados hoje, que é a de tirar conclusões sistemáticas de como age necessariamente o ser humano; e 2) para todo estudo que envolva a ação dos indivíduos, seja em conjunto ou individual, deve-se levar em conta suas invariáveis categorias e deriváveis “leis” de funcionamento, entre elas: conhecimento, preferência temporal, valor, lucro, prejuízo, custo, objetivo, e por aí vai [1].

Com o estabelecimento dessas duas condições, abrimos um leque de estudos e revisões sobre várias questões econômicas e sociais. Hoje, o que quero tratar aqui, é a criminalidade: o que a aumenta e o que a reduz. A metodologia atual traz diversas conclusões excludentes, o que cria uma gama de, não só possibilidades, mas confusões. Se existem diversos países armados (ou desarmados) com criminalidade alta, assim como baixa, não se pode concluir efetivamente (dentro da metodologia empirista) a relação entre armas e crimes. Se existem países com “desigualdade social” [2] alta (ou baixa), alguns com muitos, outros com poucos crimes, a falta de conclusão também permeia a questão. Se muitos ricos e bem instruídos cometem, de fato, algum tipo de crime, pode-se descartar que a causa seja necessariamente a falta de dinheiro e ensino [3]. E uma vez que o próprio empirismo falha, ao admitir que uma infinidade de influências pode ou não existir, cada debate sobre o assunto se resume em verdadeiras “gincanas de numerologia” [4].

Sendo assim, utilizaremos uma ferramenta importante: a praxeologia. Começo ressaltando a noção de que: ato criminoso, como o nome sugere, é uma ação, que por sua vez, como todas as outras, presume as mesmas categorias. O fim da ação, i.e o objetivo dela, podem ser (a) o mesmo de um ato legítimo, por exemplo, ter um par de tênis, ou (b) cometer o crime propriamente. O que vai definir se comprarei o tênis legitimamente, ou roubá-lo, ou até mesmo cometer, ou não, o crime por pura vontade, são, em grande parte, as categorias: valor, custo, lucro/prejuízo e conhecimento. O que quero dizer com isso é que, o que praticamente determinará qual ação irei escolher para alcançar um fim, ou se sequer agirei, é a noção efetiva da relação “Valor da recompensa x Dificuldade” que a ação traz, além de suas chances da ocorrência de sucesso ou fracasso (lucro x prejuízo) [6].

E assim, podemos partir facilmente para conclusões usando cenários hipotéticos, e a adição do bom senso, para entender o que tende a aumentar a criminalidade. Pensando como um criminoso, é preciso raciocinar o que nos traria facilidades e ausência de riscos, como por exemplo: a vítima estar desarmada, não ter cães de guarda (ou seguranças), os muros serem baixos e sem cercas, assim como a rua não ser policiada, o policiamento ser ineficiente, e até mesmo as leis locais não lhe oferecerem punições severas o suficiente em relação ao determinado crime. Todos esses, além de outros possíveis fatores, reduzem a quantidade de custos da ação criminosa, e por consequência, reduzem os riscos e expectativas de prejuízo para que cometê-la, assim passando a noção de que dificilmente o ato será danoso (e caso seja, pouco será).

Em contraste, podemos perceber que uma vítima claramente armada, protegida, com policiamento no quarteirão, câmeras, muros, cercas, vizinhança atenta, dentre outros fatores que podem ameaçar, não só a integridade física do criminoso, como também arruinar suas chances de sucesso; tenderão a fazê-lo medir os custos e possivelmente desistir de cometer um crime, e partir para o uso de métodos menos danosos de se conseguir algo, como: trabalhar até poder comprar [7].

E o conhecimento aqui é importante, não só no nível de instrução de vida [8], mas em questões de percepção e raciocínio. Deixar bem claro à possíveis criminosos sobre os riscos e custos deles cometerem crimes é essencial (e tal “clareza” sobre uma iminente ameaça ao criminoso pode ser um fator de estudo da psicologia). Da mesma forma que uma placa de “cuidado, cão raivoso!” pode te fazer hesitar em entrar pela porta de uma casa, mesmo que como convidado; a certeza ou possibilidade de sua vítima estar armada influenciará (ou protegida por outros fatores) em se ele decidirá assaltá-la ou não. Da mesma forma, quando se há leis e campanha desarmamentistas, leis e campanhas que “amenizam” - para não dizer protegem contra - as consequências da atitude criminosa, garantindo que a gigantesca parte da população não pode proteger a si mesma e ao próximo [9], reduzirá muito, ou até eliminará, o cálculo hipotético e a possibilidade real desse risco.

Por fim, devo adiantar: aumentar todos os fatores de proteção à vítima e risco ao criminoso (leis punitivas, armas, etc.) eliminaria totalmente a criminalidade? A resposta é um sonoro não. Uma vez que a moralidade e a noção de consequência são fatores de extrema importância no mundo real, é impensável conceber que não existirão pessoas imorais, ou até mesmo inconsequentes, o suficiente para cometer crimes, até mesmo em condições totalmente desfavoráveis. Mas uma vez que o ser humano age buscando um estado de satisfação maior, posso garantir que esses fatores influenciarão muito, desde que duas coisas sejam mantidas: a consciência sobre causa e consequência, e a preservação moral.


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[IMPORTANTE LER AS NOTAS!]

[1]: https://www.facebook.com/EconomiaAustriaca/photos/a.305430606629032.1073741828.249887182183375/357729788065780/?type=3

[2]: Esse termo se refere, geralmente, a diferença entre oportunidades, condições e bens entre as pessoas, separando-as em classes. É lamentável esse tipo de “medição”, com metodologia falha, ser tão notado e usado hoje.

[3]: São exemplos que de fato ocorrem quando a questão é debatida.

[4]: E justamente essas gincanas são responsáveis pela falsa impressão intelectual e admiração de vários políticos e economistas.

[5]: E para que eu não me estenda demais nesse texto, devo ressaltar dois pontos: o primeiro é que, embora haja influência sistemática, descartarei aqui a preferência temporal, uma vez que, aqui ela (1) me obrigaria a dar vários exemplos detalhes hipotéticos (como a diferença de tempo e de preferência, ou de urgência entre trabalhar para comprar, e planejar e executar um roubo) e (2) fica em segundo plano, ao tomar e analisar superficialmente esse tipo de ação, em comparação aos requisitos de agir. A preferência temporal aqui, só teria uma influência significativamente estrondosa em relação à outras categorias, no caso dela ser muito alta. Em segundo lugar, deixarei de lado abordar a moralidade, uma vez que ela seja um fator que, mesmo que influencie (e muito) no mecanismo da ação humana, também me obriga a tomar mais exemplos específicos e dissertar sobre. Embora isso, não deixarei de ressaltá-los dentro do texto. Também devem ser descartadas aqui situações de exceção, como: psicopatia, devaneios, alucinações, situação de vida ou morte, dentre outras.

[6]: No exemplo de um crime, a possibilidade de eu furtar e sair tranquilamente, ou ser pego por um tiro, ou cão de guarda, ou ser avistado e perseguido pela polícia, etc.

[7]: O mesmo ocorre na relação de escolha entre cometer um furto ou um assalto, uma vez que furtos tendem a ser menos perigosos ao próprio bandido. Em uma situação onde não há riscos claros ou discrepantes em se cometer um assalto, essa diferença também praticamente desaparece

[8]: Uma vez que o conhecimento técnico sobre como maximizar a produtividade e os bens ganhos (em qualquer área que for) podem claramente fornecer, e mostrar que existem, recompensas maiores a custos (presentes ou futuros) menores. Isso mostra que a “educação”, de fato, tem alguma influência; porém não objetivamente sistemática, e sim de visão panorâmica sobre cometer ou não um crime. Sobre esse ponto, é importante ressaltar que não é só o ensino que fornece essa visão detalhada e aberta de oportunidades e escolhas. O senso comum e a convivência, ou criação dos pais, praticamente mostram isso, o que delega ao ensino muito mais a função de “meio” após a decisão (de não cometer o crime) já ter sido tomada, do que necessariamente de “premissa” para a escolha de cometer (ou não) um crime.

[9]: Sem levar em conta a ausência de seguranças, ou policiamentos (fora o fato de o possível policial, ou possível segurança estar armado ou não) locais. Deve ser levado em conta aqui, que os exemplos servem para qualquer tipo de policiamento ou segurança, em maior ou menor grau, variando pelas suas características e “fama” de eficiência.

Nota adicional: com certeza abordarei de novo, mais vezes, sobre o assunto “criminalidade”.


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